domingo, 5 de agosto de 2007



Recital poético interativo


POR QUE VOCÊ NÃO VEM?

CÔ IBI JAGUARECÓ IARA
Essa terra tem dono!
Diz a língua tupi
Ecoando a voz de todas as nações
CÔ IBI JAGUARECÓ IARA
Essa terra tem dono!
Assim falam os Tapuias
Os Tupinambás, os Botocudos
Os Tamoios, os tupiniquins
Os Pataxós,
Tupi terra Guarani
Vem a bandeira Lusa
Que a tudo seqüestra
E leva a terra
E a terra é o homem
E o homem é o sangue da terra
... e de repente, o Nordeste

Exercícios
De um só
Soneto


Cada cor um tempo
Sua própria energia
Em si a cada caso
O estereótipo do homem
O instinto que conserva
É o mesmo que espanta
Viaja vôos infinitos
Na intensidade do tempo
A cor de cada emoção
É sangue exposto a face
É vida, natural paixão
É o altar dos delírios
Florestas de altura divina
A coroar-se de lírios


Lúdica a luz
Total qual ludez
Azul sem azul
Tom infinito
Entardece
Ante meus olhos
Nuvens chumbo
Desenham temporais
Luzes explodem
Esparsos céus
Fundem-se único
Raios que raios
Voam relâmpagos
Partem à luz


Preso na igreja
O sonho da dor
Calvário dos séculos
Arrasa madrugadas
O corpo santo
Catacumbas de silêncio
Ascendem os sinos
Ao sono da cidade
Morfeu prega peças
Ao destino atormenta
Inventa reinações
Corações em pranto
No altar do desespero
A sangrar eternidades


SONETO DESARRUMADO

apascentar silêncios
de varandas inatingíveis
quando entardece
o sentimento na sala
a vontade muda
correnteza de desafios
na corredeira do tempo
tecendo litanias vesgas
corrupio do caos
rios de tantas águas
mágoas refeitas lágrimas
riso na boca cega
empina o cio das éguas


SONETO ORIENTAL

O mundo vomita
Tuas sombras
Sobras nuas
Luar de cobras
( cobrem a carne crua )
o mundo gasta
casto e imundo
ronda o mar
a mar-te voar
( teus olhos em sonhos )
o mundo oculta
o vulto em sangue
extingue o insulto
luas de sabre


Fazer a vida feito vento
Espasmódico e silente
Silêncios de ecos divinos
Lívidos e secos, os homens
Um mar de incertezas plenas
Vaga ao corpo náufrago
Em exuberante espuma
O mistério gasto dos deuses
Mordendo os dentes de todos
A ranger o som do universo
Na melodia ausente
Pressente o futuro estático
Na ilusão sorumbática
Do último momento da vida


Todas as lembranças são inúteis
Ridícula toda a saudade,
Sutis desejos perdidos
Zumbidos de ruas e gente.
Uma casa foge-me a vista
Uma árvore talvez,
Uma folha passeia a memória
Ausente imagem em mim.
Um rosto é gasta névoa
Aquele eterno sorriso
De não sei quem
O horizonte é sempre nunca
O olhar cria signos
A paisagem não muda...


Roubar o pranto
em faces esmaecidas
a língua pérfida
remoendo angústias
Mastigar encantos
secreta despedida
ferida lépida
recriando astúcia
Em verso concreto
desenhar o rosto
ante a partida
Em caminho incerto
de todo gosto
a alma ferina


Todas as tardes são tristes
E quando o sol se põe
Meus olhos se perdem
Aonde a vista não alcança
Nunca anoitece de fato
O rosto impávido tem longos delírios
E parece nunca Ter sido
Como o homem fosse fóssil
Nada que presente errasse
No encanto desse mar imenso
Nessa luz que afaga estrelas
Todas as tardes são de fato
Nunca anoitece tão triste
O dia que em mim inventa


Um temporal se avizinha ao horizonte
O céu resplandece à luz oculta
Uma voz ausente espuma nuvens
O mar tinge-se negro ao dia
Feito densa névoa escondem-se navios
Vasta miragem desenha silhuetas
Um olhar penetra absurda ilha
Venta à imensidão de agonias
E toda a cidade fecha-se rouca
E toda a gente torta e sombria
Cria luas luzes na garganta
A voz vomita o sonho infame
Infante os passos, restos de caminhos
Em teu rosto o dia seco o temporal

2002
Exercícios
para a construção
da cidade



Ruas de miséria e vício
A palavra faz história
Ante a bruma os trilhos
Escondem os caminhos
a cidade sonolenta surge
lenta feita um sonho
adormecida à sarjeta
escorre em gemidos ocos
o uivo de sua revolta
em fuligem, fugas fumaça
desenha silhuetas
a língua feérica surge
seus nomes, seus cheiros
o lado oculto das gentes
o livro gasto
e suas árvores voam
por sobre o asfalto
o rosto de todos
o ritmo de suas casas
a geografia dos movimentos
a dor de cada beco
perde-se às estranhas
o pranto de cada encanto
a deslizar o corpo
de seu corpo à cidade
miséria e sonho
a sanha e vício
raro delírio a exibir
farrapos coloridos à aurora
de luz e luzes em sangue
desatam o riso único
entre os prédios da nova senzala
a marca dos faróis cria
a sombra dos desejos
a cidade de cada um
célere em autos liquefeitos
corre estática
em suas avenidas
o eco do mais recôndito
encerra lúdico, o verbo
entre virgulas o senso
comum espanta clones
agüenta a fome
a sede
cede as ruas de sua memória
cada cidade
pedaço de cidade
a folhear o vento
feito a mão que acaricia
seu corpo a dor
a lei
gargalhadas vibram
a sua estrutura
a vício
a sangue
entardece o cotidiano
nos passos de suas ruas
sempre outro
sempre o próximo
a incendiar a lua
feito espelho de seu rosto.



Na praça principal
Jovens laranjas
Oferecem dinheiro
Abordam transeuntes
Amarelam a face
De sorrisos ingênuos
Na praça principal
A linguagem derretida
Em passos passados
Esconde rastros
Em antigos desejos
O delírio em chamas
Na praça principal
São novos os velhos
Amigos em trânsito
Amealham trocados
Acendem mágoas
Nas raras conversas
Na praça principal
A cidade escorre
Na lira ausente
A imagem das ruas
Encarcerada nas botas
Que arrancam jardins
Na praça principal
A miséria é exposta
A alegria contida
Em troca do medo
Tangendo o povo
Um canto de escárnio
Na praça principal
Lagartos murmuram
Bestificados ao sol
Poetas e cafés
A agonia dos sonhos
E a faixa de segurança
Na praça principal
A memória de todos
Some ao vento
De todo o sempre
Só teu olhar
Desenha o silêncio
Na praça principal
Imenso o beijo
impresso nos bancos
Em cada árvore
Dançando no ar
A folha de Eva
Na praça principal
São todos culpados
Inocentes de vida
Livre caminhar
Marcando a rotina
Em dor e alegria
Na praça principal
São todos culpados
Inocentes de vida
Livre caminhar
Marcando a rotina
Em dor e alegria
Na praça principal
A língua do povo
Não aceita grades
Voar oceanos
À solidão de todo
O coração espanto
Na praça principal
O suor, a sanha
O asfalto em sangue
Fumaças trocadas
Qual fato há foto
O peito em pânico
Na praça principal
Sarará deleite
Negro branco tom
Pinte, role, deite
Feito fosse transa
Todo mundo dança
Na praça principal
Passa carro
Passa gente
Passa a cidade
De cada um
A geografia
De todas as geografias
A alma das ruas
Labirinto original
A praça de cada cidade
De cada praça
Assim e
Tal...



Canta
A rua em trânsito
Deságua
Autos enlouquecidos
A madrugada
Embala ruídos
Corpos frenéticos
Um frêmito
A rua é transe
Exaure
Luzes, raios
Asfalto, brilho
Encanta
Urbano mito
À rua insone.



1940
o silêncio dos sinos
absorve a cidade
minas de interiores
pacata luz
a expor o tempo
a cidade mergulhada
em cada um dos seus
habitantes a vagar
o corpo da cidade
é nela que nascem
e crescem aventuras
a imagem de todos
na mesma cidade
de cada um
a sua cidade
desenhada em sangue
encantos e madrugadas
um grito
um urro
um susto
sirenes e sonhos
adormecidos os sinos
divagam em nuvens
os dias mortos
a alma das gentes.



VINTE VERSOS E O SILÊNCIO


Um homem caminha e sonha
Só a comer cidades
Inventa caminhos
A aventura da memória
Percorre labirintos
Um homem anda
Flana avenidas de vício
Reza em sangue o asfalto
A pureza desenha delírios
Rios de agonia
Um homem segue passos
A solitude do absurdo
Cada vento um novo céu
Anuncia o pranto herege
Em profano encanto
Um homem,
Qualquer um que vá
É sempre o pó
A varrer veredas
O coração em pânico.



OS OLHOS DA CIDADE



Eu gosto de te ver
de todos os jeitos
eu gosto de te ver
de todos os lados
eu gosto de te ver
sem você me ver
eu gosto de te ver
na imagem que crio
feito um brilho
você no reflexo
seu corpo no espelho
nos meus olhos admiro
eu gosto de te ver
feito um voyer
dono da sua imagem
eu como você
quando você me vê
eu só quero ser
o olho que têm
o olho que é você
eu gosto de te ver
com os dedos no cabelo
a remexer idéias
como quem não pensa
eu gosto de te ver
e nada mais precisa
eu quero te ver
mesmo sem estar
de olhos fechados
até te encontrar


2003

Exercícios
Para poemas
Mínimos



TODO NOVO POEMA É UM VERBO DESCONHECIDO


Ter que ir
A fingir que anda
Sem se sair
É que a vida se espanta


Para ela
Basta que eu assuma
Mesmo que continue...


São terríveis os urros
Que o teu cadáver acoberta
É a obrigação da juventude
Que nos torna envelhecidos
Em meio ao cemitério urbano
Passeio por corpos esquecidos


Modelar
Enquanto pedra
Corpo e massa
A estátua
Desdenha
Pino formão martelo
As mãos
Escavam bolsos


São luzes
Tudo que transparece
Em meio ao céu
A lua cresce
Nos seus olhos
Toada a noite
Que há


Todo segundo contém
Em si o mistério
O tempo a escorrer
Malabarismos
Entre ele e ela
Resiste o olhar


Qual bar
Que boteco seja
Trago em mim
Todo o álcool
Feito sede
A secar-me o corpo


Envenenadas as palavras ciciam
Com seus guisos o silêncio
O momento exato
Cada vírgula é um bote


Querer exato
O que se cria
Da terra a modelar
O barro qual corpo
Transcende...


Sempre tudo
A falar
A boca
Muda
Sempre nada
A dizer
A boca
Canta


Por saber o vento
Criou asas
Por entender o fogo
Dôou-se íntegro
Por ter o mar
Amou sereias
Por viver a terra
Perdeu-se no mundo

Exercícios para uma poética do olhar


A ausência do mundo
Faz-me uma multidão
Só me resta a imagem oculta
Sob os telhados de inverno
Um seixo voa ao sol
Gritos sem peso não incomodam
As sirenes de um ataque aéreo
Sobrevoam o circo e anoitece
O direito de se Ter medo
Como a cidade em ruínas
Bombardeia os sentidos
Outros os olhos do som
Entoam a melodia das miragens
Em tua vulva faminta
O desenho de todas as cidades
Desliza ao trapézio ao sussurro
Das gentes é toda visão.



Escrever o exercício do ócio
A esvair-se como sangue
Em nós a íris perfeita
Uma linha clara
Ou um risco escuro
E sempre outro traço
A marcar as mãos gastas
Ante o muro provável
O momento certo de mais um passo
Entorta os dedos
E cresce como hera a caneta
Aprisionando as palavras



O tempo sangra
Nos olhos o sol
É o sal da ausência
Flamejante recusa
E o tempo a engolir
Um leve rumor
A roçar o sonho
Tão longe o olhar
Agiganta a imagem
E tua língua nua
Asa do desejo
Venta vôos
O nome que some
Ante os olhos a incerta
Certeza dos olhos



O dia definha
No mormaço melancólico
O mar navega ilhas
Maiores que o olhar
Mergulham golfinhos
No imaginário de Netuno
A terra gira e volta e roda e
Vai ao futuro inatingível
O fim de todos
Os tempos
Q criamos
Profundos e livres
No céu impossível



As cores são
O olhar se abre
Ao corpo o exercício
Do susto ao prazer
Pleno de domingos
No horizonte pérfido
Ocasos comem-se
Pelos séculos os heróis
Amarelam faces
Outras palavras são
O mesmo som das folhas
Na terra de ninguém
Os olhos improváveis
Do sonho ao silêncio
Manhãs e madrugadas
Perdem-se no vácuo feroz
Cabeças rolam.



E de repente
Alguma coisa pode
Acontecer na minha cabeça
O meu corpo
Explode coração
Assim de repente
Omitir-se
Em algo que
Alguma coisa sabe
Sobe o corpo
Em veias o vinho
Em vida oferta-se
E de repente
Assim como houve
Ou não veio
Todo fim é
Nada importa mistérios
E o tempo em si
Insolúvel
Consome-se
Desaparece a vida



É terna a saudade
Da Lisboa ausente
Antiga saga
Lusa tabacaria
De seus versos
Espargidos em névoa
A fumaça dos séculos
O olhar eterno
De tantas raças
Reconstruídas
No olhar absurdo.



A FERNANDO PESSOA



Agora nunca é
Sempre eternamente
Um sopro só
Sabe supor
E nem todo círculo é
Aparente, o mesmo
Esvai-se no vazio
a noite brinca, voa
Clara a lua é
Um salto basta
Olhar: é vida
A cada fuga o início



Seu olhar
Absorto em dúvidas
Divide o rosto
Perfil de enganos
Como esperança
Sempre uma última canção
Seca-lhes os lábios
Corroído em lágrimas
Impenetrável
A face da musa
Castelos ardem chamas
Os dias cinzentos repetem-se
De tantas formas reclusas
Em tantos veios difusos são enormes as solidões
Do mar
Um arrastar de almas
a invadir a casa
Perpetuando silêncios
Em meu peito agônico


2002